Falar mal da qualidade do “café de licitação” servido nos Ministérios é quase uma tradição tanto para quem vem a Brasília fazer reuniões com o Governo, quanto para servidores que trabalham na Esplanada*.
O problema havia sido, aparentemente, resolvido no Ministério da Economia: ontem foi comunicado aos servidores a suspensão do fornecimento de café, conforme a Portaria 424/2019. As máquinas foram prontamente recolhidas logo no início do expediente e deixadas no primeiro andar do prédio (vide foto abaixo).
Outras medidas polêmicas previstas nessa Portaria já vinham sendo implementadas, como a que define o horário de funcionamento das 8h às 18h. Antes e depois deste período, as luzes do Ministério são desligadas para economizar energia.
Evidentemente que são medidas mais simbólicas do que práticas, visto que a economia gerada com essas ações serve mais para que o Ministério da Economia “dê o exemplo” para os outros ministérios do que de fato contribuir para o cumprimento do teto de gastos, com o qual tem sido cada vez mais difícil conviver.
O teto, estabelecido pelo governo Temer, impõe um limite de dispêndios primários do governo central para 2019 (sem contar pagamento de dívida) de, aproximadamente, R$ 1,4 trilhão. Nesse valor estão todos os custos dos três poderes no âmbito federal, inclusive os benefícios previdenciários. Até agosto, foram gastos R$ 868 MM, dos quais 45% foram previdência e 7,3% foram despesas discricionárias.
A parcela discricionária é a que serve para custeio e investimento. Além de ser uma proporção pequena do orçamento total, parte desse gasto é bem mais difícil de ser contingenciada do que o cafezinho do Ministério da Economia. Além do próprio custeio da máquina, sai dessa conta o dinheiro para bolsas de estudo, o programa Minha Casa Minha Vida, investimentos em infraestrutura, entre outros gastos.
Na verdade, segundo informação do pesquisador da Fundação Getúlio Vargas, Manoel Pires, se os gastos discricionários ficassem abaixo dos R$ 120 bilhões para o ano inteiro de 2019, o governo não conseguiria cumprir suas funções básicas e poderia entrar em shutdown. Até agosto, foram gastos pouco mais de R$ 63 bilhões, ou seja, muito próximo do mínimo, caso o valor seja anualizado.
A grande questão é que, além de irritar os servidores, cortar o cafezinho não faz a menor diferença do ponto de vista orçamentário. Talvez por isso, ainda na parte da manhã, o Ministério da Economia voltou atrás na decisão. O certo é que o gosto amargo agora não será mais somente do café, mas de uma restrição cada vez mais indigesta com a qual o governo precisará conviver.
*Nota do autor: Pessoalmente, não vejo problema nenhum no café servido na Esplanada, mas estou muito longe de ser um barista.